Um Circo, um Palhaço, um Pipoqueiro, alguns amores, muitos porres. E uns textos complicados sem pé nem cabeça.

14.2.05

CRENÇA

Balançar, balançava. Agora, já não mais.
Fez numa colher simples de bronze, engolir o doce
Que foi doçura pro meu sonho
E pôs-se a tossir tolices
De quem o tempo só comeu tempo
E não estancou o choro.

Oras vil, busquei tento pro meu vácuo
Mas na imensidão do nada, nada encontrei

Precisei de algo pra me apegar,
Me apegar.
E mentiras pra acreditar, e não crer.

Ao descobrir que verdades não nascem,
São criadas por babás maldosas
Me desliguei do surreal,
Sem cessar a peleja pela morbidez
E de algo pra me apegar
Me apegar.

11.2.05

Se está aqui jogada no chão, deve ser por que alguém perdeu. E como quem nada quer, a peguei pra mim. Uma presilha vermelha com uns detalhezinhos amarelos, no meio do salão pode ser um bom sinal. Continuei andando com o copo numa mão, e a presilha, que abria e fechava constantemente, noutra. Talvez eu até quisesse me desfazer do copo, mas qualquer tipo de álcool é aceito no carnaval, levado em conta a animação de todas as pessoas sãs que ali se encontram. Matei o copo num último gole, coloquei a presilha no bolso do calção e entrei no banheiro afim de evacuar. Enxergando pouco mais que dois metros à frente, mirei no vaso e me senti livre do incômodo urinário. Acabei pegando outro copo de qualquer coisa forte que me ofereceram na tampa do balcão, e mostrei a ela o que eu havia encontrado no meio do salão. Surpresa, ela pegou a presilha da minha mão e disse que era linda, como se estivesse me agradecendo pelo presente que não lhe dei. Expliquei a ela que era realmente bonita, mas que não poderia lhe dar porque não sabia a quem pertencia. Ela insistiu com um “mas é minha, perdi logo que entrei” , que não me convenceu. Tudo bem, podia até ser dela, mas peguei de volta dizendo que queria ficar com uma lembrança daquela noite. Sem muita dificuldade, acabei despistando a menina que tinha saído para ir ao banheiro, e continuei perambulando embriagado pelo salão. A bebida eu mais derrubava do que tomava, porque naquela altura no campeonato eu já me achava o próprio Rei Momo, de tão “alegre”.
À medida que aquelas marchinhas eram desenroladas pela banda, eu marcava o passo estático num canto, encostado na pilastra. E alguns tentavam me fazer companhia, mas eu não tinha condição alguma de participar de um papo alto, a não ser na altura que o álcool já tinha atingido. Mas mesmo assim me mostrava alegre, sorrindo até para os podres e falsos foliões que me abordavam. Foi então que dei de cara com uma menina que fiquei fitando logo no começo da farra, e que viria questionar porque eu estaria dançando (ou tentando) sozinho e tão timidamente. E eu fingiria que não tinha ouvido, aproximando meu rosto áspero ao dela, rosado e suado. Ela então repetiu tão alto que cheguei a pensar que falava de um megafone, mas desconversei, me lembrando do verso de um samba do Batatinha: “...sofrer, também é merecimento... cada um tem seu tormento, quando a hora é da razão... alguém vai sambar comigo, e o nome eu não digo... guardo tudo no coração...!”
Agora quem não ouviu foi ela, mas entendeu quando coloquei a mão no seu coração e abri um sorriso de metro, tirando do bolso do calção a presilha vermelha com uns detalhezinhos amarelos que eu a vi perder quando passou por mim, assim que entrei no salão...