Umas cartas
Eu escrevia como se fosse enviá-las, mas sabia que me faltava coragem. Eram na maioria cartas tristes, daquelas se ela tivesse lido iria me achar o cara mais angustiado e sozinho do universo, embora em poucos dias eu já voltasse ao normal. Nelas dizia que nada tinha mudado, que eu continuava o mesmo vagabundo de sempre, sujo por fora e puro por dentro, de alma e coração, um cara sem ambições pitorescas, idéias que não eram fáceis de se acreditar, mas ainda assim eu continuava escrevendo aquelas cartas, e para mim era como se ela tivesse lido todas elas, inúmeras vezes, mesmo sabendo que a essa altura eu já era apenas mais um.
Novato
Se tem uma coisa que custei a acreditar era que dinheiro pudesse mudar as atitudes de alguma pessoa. A não ser as pessoas completamente descabeçadas, sem um pingo de valor e pé no chão. Não sei se é porque passei uns dois anos abanando o rabo pra qualquer um, mas agora que consegui um trabalho decente (que como já disse, dá até comida e transporte) ainda não sei o que é desfrutar desses prazeres todos, parte porque sou mesmo um cabeçudo com dívidas e parte porque sou apenas cabeçudo que sempre reclama de suas giletes amarelas de 1.41
Questão de tempo
Sabia que algum dia eu iria chegar e dizer pra mim mesmo "bons tempos aqueles, não?" e que não seria a primeira e nem última vez. Mas agora é diferente, eu realmente não sinto falta daquela fase de descontrole em relação às mulheres, de gostar de todas e nenhuma ao mesmo tempo. E curioso era que eu não tinha firmado nada com nenhuma delas, e talvez por isso eu tinha até um certo receio. Mas a questão é "lute sempre pelos bons tempos, porque você sabe que eles não vão durar muito..."
Forçando a barra
A primeira "temporada" que passei sozinho em São Paulo durou cerca de quarenta dias, e eu não queria voltar pro interior de jeito algum. Fiquei tão maravilhado com a imensidão das coisas que achei que aqui fosse definitivamente o meu lugar. Hoje já não penso mais em toda essa baboseira, mas estou vendo até onde consigo chegar caso fique aqui por volta de um mês. E é o pretendo fazer, me testar, voltar a lutar pelo "ir até o fim".
A parte boa (e suja)
Se a preocupação de antes era o excesso de álcool, hoje já não acho que isso me incomoda. Beber é uma coisa que tenho feito pouco, por incrível que pareça. Eu até que gosto de passar um tempo na onda boa, me esquecendo de como é gastar a noite toda enchendo a cara, na companhia indispensável de meus parceiros, mas aí quando bebo um pouquinho (só um pouquinho mesmo) já percebo que me tornei um fraco, tudo isso por questão de uns vinte dias longe do remédio. É falta de prática.
O mundo Royal
Antes eu só achava que o Cara lá de cima tinha me reservado uma vaguinha de milionário e detentor de títulos de golfe, squash e gamão indoor, mas hoje posso dizer, com algumas poucas oportunidades que tive, que esse mundo é mesmo nojento e sem escrúpulos algum. Muita gente querendo se comer por vaidade e mesquinharias. Muita boca, peito, bunda, dólares e pouco (mas pouco mesmo) cérebro. Pessoas da mais fina fatia da sociedade, frequentadores de torneios de turfe e jantares a três mil reais, o prato (ah, perto de casa tem um frango + arroz + feijão + fritas + salada por cincão, o prato), e não sabem sequer como é possível uma pessoa dar vida a um simples desenho na folhade papel ou talvez clicar no link "enviar" pro e-mail aqui do Brasil ir parar na LeMon Bijou, faculdade de etiqueta da sua filhota, em algum lugar da fedorenta França. Decidi me afastar de tudo, prefiro meu PF (por cincão) e meu cigarrinho vagabundo (e falsificado) que o sempre sonolento, mas gentil, Seu Horácio me vende nos domingos de manhã.
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