Um Circo, um Palhaço, um Pipoqueiro, alguns amores, muitos porres. E uns textos complicados sem pé nem cabeça.

10.8.05

À MÃE

"Mesmo ainda estando perto de casa, já consigo sentir os poréns da mudança. Noto que minhas mãos engrossaram um pouco, e uma densa e áspera camada recobre a minha face.
Esse fardo insuportável da consciência somou-se com o peso da bagagem, e assimilo como se já fossem parte de meu corpo.

Talvez até a metade do caminho toda a comida já tenha acabado, mas nada me impede de trabalhar pra conseguir o próprio sustento. Dinheiro eu não tenho muito, pois o pouco que juntei ajudou a pagar o silêncio da menor. Aliás, cuide para que ela se recupere da saúde, e que não pare os estudos por nada.

*****

Já estou na metade do caminho, e por sorte ainda tenho alguns biscoitos que peguei escondido no pote da vovó. Sei que isso não vai te fazer bem, mas quando digo metade do caminho estou enganando a você e a mim, porque ainda não sei qual é meu destino fiel.

Vou andar e rumar conforme as oportunidades forem surgindo, mas neste momento as coisas estão um pouco difíceis. O outono aqui é inimigo de qualquer aspirante de jardineiro, por mais competente que eu seja.

Conheci uma mulher no centro, que acabou me oferecendo ajuda. Vou passar uns dias no sítio dela, cuidando da horta e dos animais. Talvez ela me dê algum dinheiro e comida, e só assim eu prosseguirei minha jornada.

*****

As coisas têm melhorado um pouco, a cidade é pequena e todos se conhecem pelo primeiro nome. Em uma semana ou duas vou tentar algum trabalho no comércio, há muitos feirantes por aqui.

Depois que eu juntar algum dinheiro, mando para pagar as despesas do hospital da menor. Não se preocupe comigo, por favor. Assim que chegar lá, eu volto a escrever.

Um beijo, e saudades.

Firmino"